sexta-feira, 25 de outubro de 2013

O poema em tempos de barbárie


 Existe possibilidade de poesia em um cotidiano embrutecido? A questão inspira “O poema em tempos de barbárie e outros ensaios”, de Vera Lins, lançamento da Editora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (EdUERJ). Em suas reflexões, a autora enfoca o poema que surge como ato de resistência a uma realidade social inóspita, ou que se propõe resposta ao estado letárgico da sociedade de entretenimento. Com espaço para questionamentos filosóficos e existenciais, o livro observa o protagonismo do verso, do autor e também da crítica literária, em produções dos séculos XX e XXI.

 O artigo-título faz referência a Theodor W. Adorno, expoente da Escola de Frankfurt, que declarou a impossibilidade de se criar poesia após Auschwitz. A professora Vera Lins debate este paradigma, somando a ele, concepções de outros teóricos, como Slavoj Zizek. Este último atualiza o pensador alemão, argumentando que é a prosa (e não a poesia) que se mostrou impossível após Auschwitz, dada a pungência do fato real. 

 Com a ajuda de versos de Paul Celan, Sebastião Uchoa Leite, Murilo Mendes, Haroldo de Campos, entre outros, Vera Lins guia o leitor em suas explanações, argumentando que se a realidade mostra-se difícil, é justamente do dilaceramento que nasce a esperança. Enquanto a prosa inclina-se frágil diante da realidade, a poesia tem a vantagem de seguir por caminhos menos literais, proporcionais à imaginação ou à ousadia do autor.

 No livro, alguns autores são comentados em capítulos específicos, como o alemão W.G. Sebald, e seu trabalho com texto e fotos, assim como o cubano Nicolás Guillén, mencionado por suas elegias. Neste sentido, destaca-se o capítulo Confinamento e deslocamento na poesia brasileira de Cruz e Souza a Ferreira Gullar, tratando de dois representantes de períodos distintos, cuja obra, em comum, denotava resistência (como Poema sujo, de Gullar, ecoando o exílio).Também merece menção especial o capítulo que analisa o impacto causado pelo quadro Arrufos(1887), de Belmiro de Almeida, que escandalizou por trazer imagens de intimidade para uma sociedade habituada a ilustrações de cunho menos pessoal.

 Dialogando com a inserção do poema em tempos de crise, a autora reserva um espaço para falar da crítica literária. Esta é abordada em capítulos como A crítica de arte e o jornal, “A crítica em tempos de guerra: Ruben Navarra e os anos 40”, para citar alguns.

 Ao todo são dezesseis artigos que podem ser lidos de forma autônoma, e que, juntos, constituem uma indicação sobretudo aos estudiosos da literatura, mas também aos interessados em arte no seu aspecto mais amplo.

 

 

 

 

 

 

 

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